sexta-feira, 16 de março de 2007

Luz, Câmera, Push Start

Parece que a discussão do momento é cinema X videogames. Ou mesmo arte X videogames. O blog da Ilustrada cantou a bola. Com a estréia nos EUA de 300, filme de Zack Snyder baseado nos quadrinhos de Frank Miller, a crítica se divide (que novidade): o trabalho é videogame demais e filme de menos ou a influência dos videogames no cinema apenas tornou-se evidente, pois já existia há uns bons anos. Não tendo visto o filme (aqui só chega no dia 30 deste mês), posso dar apenas um dedo na conversa.

O game é a mídia mais cinematográfica que surgiu desde o próprio cinema (a TV não conta com um fator fundamental: atenção e envolvimento totais do espectador). Geralmente o rótulo “filme que parece videogame” se restringe apenas ao uso de efeitos especiais e exageros narrativos. Mas a influência dos games na sétima arte é das antigas. Não apenas em adaptações suspeitíssimas como Super Mario Bros. (1993) e Street Fighter: O filme (1994). A fascinação com o universo virtual vem desde Tron (1982), o clássico nerd com Jeff Bridges.

Mas foi além. Em filmes como os da série Matrix, os irmãos Wachowski não se acanharam nos movimentos de câmeras típicos de cut-scenes (aquelas cenas entre as telas dos jogos, em que não é possível controlar o que acontece), ou mesmo vindos de títulos agitados da geração 3D – caso da cena da Freeway, em Matrix Reloaded (2003).

Em uma cena fantástica do excelente Oldboy (2003), o protagonista caminha por um corredor enfrentando brutalmente com um martelo dezenas de vilões. A câmera se posiciona lateralmente, como em um jogo de luta de plataforma, movimentando-se apenas na horizontal e sem cortes. Isso sem falar nos filmes de Quentin Tarantino e Robert Rodriguez.

Essas inserções são saudáveis, um intercâmbio natural. O cinema toma emprestado a percepção da interatividade para aproximar o espectador da situação, utiliza uma noção desenvolvida previamente. Ruim só é quando são ignorados os limites do meio. O erro mais freqüente são os abusos desses recursos sem levar em conta a percepção participativa do espectador.

O protagonista de um videogame é formado 50% pelo jogo e 50% pelo próprio jogador. A personagem é um amálgama das limitações de um e das escolhas do outro – mesmo quando as escolhas são pré-definidas, há a noção de que o caminho até a escolha foi trilhado por quem joga. O cinema morre antes disso, impossibilitado de transmitir as sensações reais de participação, como perda, culpa, satisfação.

Game é arte, sim. Mas muito mais jovem que o próprio cinema. Nasceu e desenvolve-se em um meio criado para lucrar financeiramente. Embora as comparações sejam inevitáveis, ainda há de se deixar tudo apenas no campo das influências. Cada um em seu cada um. Com seus Cidadão Kane e O Poderoso Chefão ou seus Metal Gear Solid e Half-Life 2.

+
Trailer do filme 300 (em inglês)

Nenhum comentário: