segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

A gente sempre precisa de amor

Um desejo quase infantil me move a assistir musicais. É aquela vontade de acreditar que as pessoas podem realmente estar andando na rua mau-humorados com suas pastas executivas e de repente começar a cantar canções em uníssono, rodopiar e dançar coreografias extremamente complexas como se isso fosse o caminho natural da vida. É inocente.


Entretanto, quando abandono meus desejos primários, percebo que um bom musical precisa mais do que passinhos ensaiados e gente com voz bonitinha cantando. Também vai além do videoclipe e das canções-tristes-para-momentos-tristes e das felizes-para-momentos-felizes. Dá sim para fugir disso, brincar muito com as imagens e até experimentar novas maneiras de transpor a vivacidade do parágrafo acima sem cair na mesmice. O problema é que poucos diretores tem colhões para tal.

Julie Taymor, diretora de Across the Universe, parece ter inicialmente tentado provar que um musical bem feito poderia ter muita experimentação visual, porém, o resultado final parece provar que os estúdios sempre tem a palavra final. O que é triste, porque potencial o filme tem. Mas vamos começar pelo mote: Beatles.

A trilha sonora é inteirinha composta por músicas do quarteto e cantadas (mal) pelos atores. Agora tente imaginar este samba do criolo doido: o longa tenta acompanhar a discografia, a trajetória pessoal, o posicionamento deles no contexto da época, as situações memoráveis pelas quais eles passaram, mas sem representá-los fisicamente. Linke tudo isso a uma história de amor fictícia, cujo os personagens levam o nome das canções mais famosas. Um trabalhão do cacete e o filme ainda tenta enfiar Jimi Hendrix e Janis Joplin, como um casal pseudo-fofo. Over.

A tal história de amor é sobre Jude (Jim Sturgess), um garoto inglês, que vai morar nos Estados Unidos e curte o clima efervescente dos anos 60. Enquanto muitos jovens estão se engajando contra a Guerra do Vietnã e outros sendo convocados à lutar de fato, Jude se mantém alheio e entra de cabeça na paixão por Lucy (Evan Rachel Wood). Como você já pode prever, rola aquela dificuldade básica de ficar juntos (ou não poderiam tocar All You Need Is Love quando tudo se ajeita).

Não se pode esperar veracidade de um musical, mas também não dá para ficar forçando situações só para poder encaixar as canções e seus respectivos temas. Não gostei de Strawberry Fields Forever e odiei muito Dear Prudence. Hey Jude é óbvia, assim como Revolution, Across The Universe e All You Need Is Love, que não poderia deixar de ser fofa e edificante. Porém, I Want You (She's So Heavy) e I’ve Just Seen a Face são ótimas. Fora as participações especiais. Bono, tão envelhecido que eu quase não reconheci, Joe Cocker, caracterizado de mendigo e Salma Hayek, amiga da diretora, como uma enfermeira sexy.

Peca pelo psicolodelismo clichê em muitas cenas e é bem previsível em outras. Poderia ser melhor? Sim. É o melhor musical que já vi? Não. Vale a pena assistir? Sim. Nem que seja só pelo gostinho de ver uma concepção diferente para as memórias afetivas que todos nós temos para as músicas dos Beatles. Ah, e dá sim vontade de sair sapateando pela rua. Não me culpe, sou só uma menininha!

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