segunda-feira, 2 de abril de 2007

Há algo de over no reino...

Quando você entra no teatro, logo dá de cara com os quatro atores em cena, bebendo, fumando e rabiscando uma enorme lousa negra com giz branco. Num ambiente soturno, o aroma fica por conta das centenas de bitucas de cigarro jogadas no chão. E o espetáculo corre com os atores desfilando diversas visões sobre a morte. E por que não, sobre a vida. O giz se transforma em ferramenta inteligente para os cenários que vão sendo rabiscados conforme as histórias vão se desenrolando.


A peça é ADUBO ou a Sutil arte de escoar pelo ralo, do grupo brasiliense TUCAN (Teatro Universitário Candango). Várias coincidências me fizeram preferir ver essa peça ao invés da Mostra do Cemitério de Automóveis, que era meu objetivo inicial. O grupo de Brasília também foi formado numa faculdade e assim como o Teatro Insano, está em cartaz com a peça de autoria própria desde de 2005, tal qual nosso Amores Dissecados. Outra coisa que me chamou a atenção foi a pesquisa de tema que o grupo fez. Oito meses pesquisando a morte. Tema esse que me fascina na mesma medida que o amor.

ADUBO é uma peça irônica, porque o que chama a atenção nela, é também o que a condena. O texto bacana e ágil funciona em sincronia com a coreografia (literalmente) dos corpos dos artistas. Apesar da expressão corporal incrível (algo que como atriz iniciante, sei que é muito difícil de conseguir), há algo de over no reino. Em alguns momentos, a peça sofria pelo "teatrar" demais. Acredito que o ser "over" era completamente consciente no grupo, dado a maquiagem negra na cara, os comprimidos aos montes que os "mortos" tomavam e o figurino. Até aí, tudo ok. Mas senti que algo ia além do consciente e escapava como exagero despercebido, principalmente na atriz Rosanna Viegas, fora do timing dos outros atores.

Assim como a morte, algo ronda o pescoço do grupo. O expediente dos atores e da direção ficava o tempo todo escrito na grande lousa negra, dividindo espaço com os criativos desenhos. No programa da peça, uma declaração de Fernanda Montenegro elogiava os atores. É bacana, sabe... mas a pergunta é: precisa?

O toque a mais do perfume condena o agradável aroma e o transforma em uma leve náusea.

Vale pelas várias saídas (de mestre) cênicas, pelo texto engraçado, pela pesquisa teatral e pela energia que não despenca nunca durante os 70 minutos de espetáculo. Aliás, energia realmente faz TODA a diferença.

ADUBO ou a Sutil arte de escoar pelo ralo: Sextas e sábados, às 21h; domingos, às 20h; R$15,00 - Centro Cultural São Paulo - Sala Jardel Filho

Nenhum comentário: